O poema que me sorri na tarde Com a carne dos sonhos nos dentes É feito de brisa e sol E alguma tepidez no ar É um poema que me ensina A sucumbir e sobreviver a um tempo Perquirir as perguntas mais difíceis Que o tempo todo me faço Sem o agrado das respostas Todas cortantes, frustrantes Lacerantes, mesmo lancinantes, às vezes Quando a noite cai Sem o consolo mínimo de uma bebida Ou a carícia inovadora da mulher inesperada (Por que não mais espero)
Este poema na tarde No interregno de tudo Que preciso alcançar para ser eu mesmo De negativa em negativa De negação em negação Este poema, enquanto espero a redenção dos juros Este poema revira-me Aos próprios olhos Sem esgar nem piedade Para o exame de corpo de delito Das escoriações muitas e várias Que desferi, cruel, ao longo da carne Pisada a pele
Hesito face ao êxito Habituo-me facilmente ao hábito Quero seguir anônimo Nas veias de um quotidiano anódino Rumo ao rio do esquecimento Morrer lento, sem cor Esvai-se-me o entusiasmo Os dias passam As horas escorrem ao seu abismo último No entanto, das entranhas, afinal Um poema se levanta Como alento e muleta Apoio e escada Para os pés na escarpa do caminho
Não há razão para tanta lágrima Que não valha um riso Não há tristeza tanta em um coração Que não pague um grito