O galope da gazela
arisca, a gazela cisca
o terreno escoiceia
dança um balé de pinotes
sobre a savana e a areia
foge por entre horizontes
busca a paz das estepes
retorna, exangüe, quedada
de volta ao seu torvelinho
quer comida, carinho
mas, já não sabe de nada
pervaga confusa, atônita
seu espanto não compreende
assusta-se deveras consigo
sem saber o que sente
para além de um tépido desejo
que a faz tão úmida por dentro
e por fora tão seca, espinhosa
medonha, faceira a um tempo
vai a gazela ao relento
por vezes, quase uma égua
de tão farta e desejosa
vislumbra o mundo das fêmeas
território em que não ingressa
por algo que lhe escapa
para além da pelagem curtida
é que à gazela lhe falta ser tida
igualmente como fêmea
fica ali na savana
arisca, exposta aos iguanas
e tende a ser devorada
não pelo lentos iguanas
que não lhe igualam o galope
mas, por seu próprio galope
que do amor continuamente evade
arde, a gazela arde
na solidão do seu corpo
tudo o que quer é pouco
tudo o que tem é pouco
pois a si mesma escapa
e o que come é nada
para sua fome escassa
para o seu medo tanto
louca, a gazela estiola
a razão do próprio pranto
e chora, a gazela chora
sem comover seu espanto
grita, a gazela grita
sem dar conta das horas
quer-se calma, tem-se lânguida
quer-se tesa, tem-se presa
e como uma lâmina ao vento
seu galope a leva veloz
sempre de encontro ao momento
sempre em fuga atroz

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