Assim seguiam os cinco irmãos O primogênito natimorto Morto o segundo às portas dos cinqüenta anos O terceiro ido com quarenta e poucos O quarto também natimorto Restou, apenas, o temporão Aluado, aéreo, biruta ao vento A caminhar na vida com os passos dos seus irmãos O protagonista O antagonista O coadjuvante O figurante E ele, o espectador Todos artistas Entre vida e morte Prazer e dor Legião! Demônios astutos travessos sinceros e dissimulados Passavam-se todos por inspiração Os que sequer haviam nascido Mais até que os morridos Misturavam-se ao temporão Alternavam-se, embaralhavam-se, enlouquecidos A obrigar-lhe concomitanteintermitentecontínuo serão Sempre em falta Sempre perdido Sempre em baixa ou em alta Sempre aturdido Seguia o pobre diabo Muita vez de si esquecido E de sua obrigação Afoito por ser reconhecido Muito embora, no seu desgosto Se tivesse tornado máscara sem rosto A quem só se podia dizer não Não! Não lhe conheço Não! Não lhe reconheço Quem é você? Qual dos seus irmãos? Por que caminha tão presto para fora de si Confundido em meio à multidão? Multitudinário parlapatão! Onde está que não se vê? Quem é você? Quem é você? Legião!
Assim seguiam os cinco irmãos Um em cada alça do caixão Onde repousava ao cortejo o corpo do vivo Por que motivo? Por que motivo Não vive o temporão os seus desejos? O tempo passa E os quatro, nele, redivivos São uma constante ameaça De que tempo não haja para o que é vivo Enquanto a morte grassa Pelos confins de sua alma e desvãos O que lhe dá uma sensação de eternidade De todo tempo do mundo De todo tempo da vida O que é uma farsa - na verdade Da qual, porém, está convencido Em sua letargia Em sua trajetória erradia De onde irradia, oculto A luz de um prisma de cinco faces Ora santo Ora canalha Ora cajado Ora mortalha Ora túmulo veludo e palha Os anos deitam A pátina do tempo Sobre seus ossos, que estalam Como gravetos na pequena fogueira Ao quintal da finada família Todos se foram, partiram Restou provisoriamente o temporão Como uma ilha assombrada Seus fantasmas o fazem arfar daqui para ali Com passos trocados e alquebrados Apressados e presumidos A pedir esmolas a mendigos A implorar pelo amor de falsos amigos A indiscernir entre aliados e inimigos A interpretar a emoção como juízo Confuso, difuso, distante, ausente e diluído... Já mais velho que o irmão mais velho Que morreu rebento Inda assim mais jovem que o irmão mais novo Que nasceu defunto Um espantalho de luto ao relento A afastar os abutres das imateriais carcaças A espernear da areia ao mar do esquecimento Com pueris pirraças - versos e melodias ao vento... Um garotão envelhecido Um cinqüentão inconseqüente Que não chegou a ser ele mesmo Permaneceu por todo tempo a esmo, impertinente Em legião
Assim caminham os cinco irmãos Reunidos em um só corpo Quatro vivos e um morto...
Por que motivo? Por que motivo eu me pergunto Se quatro já moram na cidade do pé junto E resta um só entre os vivos, por enquanto? A resposta, sei, pode causar espanto Mas, é uma só - diga-se o que for Só um motivo une ao morto o vivo E é tudo que cabe em uma canção ou um livro É o amor, é o amor!...