Se há em uma letra de uma canção um elemento narrativo qualquer, e há, ele não chega a ser propriamente dramático, no sentido de contar uma história com princípio, meio, fim e pelo menos algum detalhe ─ como nos sugerem os gregos, desde Homero, e que a Hollywood de Tarantino tratou apenas de desconstruir a cronologia, sem romper-lhe o fio condutor, entretanto, que invariavelmente desliza sobre o aro do tempo.
Não há narrador que possa fugir desse austero e fanfarrão senhor de quem a história é esposa dileta, em seu vasto harém de modestas e suntuosas serviçais, mesmo as mais inconformadas ou inventivas...
Apenas os poetas o mistificam e desqualificam com suas narrativas modais, atemporais, atonais, disformes, dodecafônicas, mas é tudo brincadeira mera, um jeito peculiar e moleque de quem sonha respostas inimaginadas para enfrentar de forma diversa (e divertida) esse estranho relacionamento de nós homens com a passagem do tempo.
Na nossa música popular, Roberto & Erasmo (sempre eles!) foram os caras que levaram mais longe, creio, essa obsessão narrativa em sentido tradicional; até mesmo por depoimentos do Erasmo a respeito, percebe-se que esta sempre foi uma preocupação central na construção de suas letras tão bem-sucedidas em termos de comunicação com o público. Suas canções verdadeiramente contam histórias e eu sempre apreciei isso.