23 de junho de 2024 às 16:00
Refundação dos estados gerais
Não se iluda; ninguém engajado profissionalmente no sistema político pode vir a desmontar os mecanismos desse sistema em favor de sua reestruturação. Nenhum macaco serra o próprio galho. O mundo democrático, cada vez mais fragilizado como prática e inversamente fortalecido como alternativa real de coexistência, carece de uma assembléia geral de refundação dos estados gerais. E a mesa, desta vez, a exemplo de Artur, terá de ser redonda. Sem cabeceira. Mesmo que à sua volta não se sentem propriamente cavalheiros como Lancelote. Ou todos nos entendemos como parte do todo ou vamos pelos ares, em algum momento. Como muitos já têm ido em dantescos ensaios. O estado contemporâneo, mais que descentralizado, tem de ser fragmentado. Se quisermos que volte de fato a funcionar em favor da sociedade e não de sua própria máquina de extorsão, apenas. Um sistema compensatório é válido, mas não ao ponto da submissão federativa. São as estruturas que validamos que nos permitem ser piores do que nós próprios desejaríamos. A ocasião faz o ladrão. Machado que me perdoe, estava errado o mulato. O arrependimento, sim, é pessoal e intransferível. A organização social contemporânea propõe o ladrão, o roubo. Só indivíduos dispostos a renunciar ao tentador desejo de ser vil com autorização pública podem construir novas relações sociais para o conjunto da espécie, em harmonia com as demais formas de vida do planeta. Essa gente existe e está por aí. O problema é convencê-la a subir na cruz com seus olhos azuis. Estes indivíduos da refundação não podem ser eleitos por longos períodos e muito menos empossados ou investidos, pois, feito isso, corrompem-se como todos os demais de nós. É preciso admitir que o homem piorou muito, moralmente falando, nos últimos cem anos. Embora, por outro lado, haja avanços sensacionais em outros campos, inclusive da ética e da moral também. É a contradição do caos! Uma reformulação, portanto, deve obedecer a outros mecanismos e metodologia. Ninguém pode ser convidado publicamente a ser pior do que é. A política faz isso. O judiciário também, no Brasil pelo menos. O legislativo dá a outorga. Vai, diz o legislador, seja pior, não se acanhe!
Se caminharmos na lógica do sistema, que é a lógica da centralização, teríamos de conceber um organismo de controle mundial - a ONU, por exemplo, é uma tentativa neste sentido. E não funciona a contento! Apenas para os diplomatas! O caminho é o contrário disso: a descentralização. Mais: a fragmentação do poder em multicentros, como a rede mundial de computadores. Que funciona. Apesar das tentativas governamentais de controle de tráfego e monitoramento de conteúdo.
Claro que há necessidade de lei e ordem. Isto é ponto pacífico, raios! O que não dá mais é para que as leis sirvam apenas a monopólios, oligopólios estatais e corporativos. Isto não está funcionando a olhos vistos, estamos perdendo o ponto de equilíbrio em nível global e todo o aparato político vira-se de costas para os fatos que vêm das ruas. A coisa tende a se agravar, ora bolas! O erro geral está na permissão para a concentração de poder em mãos de um estado extorsor acumpliciado com corporações extorsoras que enfraquecem e sodomizam os indivíduos e as sociedades, engolidas umas pelas outras em sistemas predatórios de concorrência sem arbitragem possível. A OMC serve a quem, cara pálida? Adam Smith, coitado, é o Charles Darwin da economia contemporânea! Sua mão invisível bate, diariamente, a carteira vazia dos pobres. Sem dó nem piedade. Impostos impostos e mais impostos! Generalizou-se a prática do assalto. Temos de refinanciar o caviar, afinal! Todos agora fazem isso abertamente e à luz dos dias. As corporações dispensam-se [com autorização do Estado] de sedes físicas quando prestam serviços públicos no terceiro (i)mundo. Beleuza! Vou requerer uma aposentadoria por tempo de sevícias!
As demandas contemporâneas por ordem política, econômica e jurídica não passam mais por ideologias. Mas, por funcionalidade. Nada nos adianta ir a Júpiter e ter, ao mesmo tempo, crianças morrendo de fome. É preciso conceber um ordenamento que nos leve a Júpiter e encerre o capítulo da fome na história da humanidade. E as condições já estão dadas. O problema é que como indivíduos estamos capturados por um sistema que não funciona em favor do coletivo.
Acostumamo-nos com a idéia de que é preciso lesar a alguém para obter lucro. Mas, isso não é mais real! Nadamos em excedentes! Materiais. Tecnológicos. O que se discute agora é o grau de sado-masoquismo implícito em nossas relações econômicas, uma vez que são oriundas do trabalho escravo. Catso! Quando é que vamos pôr na mesa dos sindicatos [apodrecidos] essa questão?! O fato é que estamos reféns de um padrão superado e não nos damos conta disso no plano diário de realidade, vimos funcionando como antigamente. Antigamente mesmo! Cavernas!
Com efeito, as transformações necessárias para que o planeta funcione a favor da vida são infinitamente menores - isto mesmo, menores! - do que possam supor as utopias revolucionárias de outrora, que ainda tremulam em peitos desavisados. As responsabilidades afetivas e as tarefas ético-morais para tanto é que são imensas, hercúleas e ciclópicas. Portanto, estou falando de revolução ao nível do comportamento, o que significa revisão do contrato social. Os pobres do mundo não podem continuar pagando a farra do hiperconsumo de drogas por um motivo elementar: estamos enlouquecendo com isso! Alguém tem dúvida? Oquei. Vou ser chocante, então. Uma garota viu-se obrigada a cheirar uma carreira de cocaína estendida ao longo do pênis extremamente rijo de um jovem traficante que a ameaçava e ao namorado, com uma arma na cabeça, diante de um motorista de táxi que se mijava nas calças, na descida da Grajaú-Jacarepaguá, sentido centro da cidade. Madrugada dessas, no Rio de Janeiro. O meu narrador foi o motorista mijão. Salvaram-se todos. Não é sempre que acontece. Morto mesmo já estava era o jovem traficante de pênis rijo. Alguma dúvida?