11 de julho de 2024 às 00:00
Da hora do escanhoar na manhã depressiva
Não! Não sou o fracasso completo
Que ao espelho me vejo
Minha filha me ama e diverte-se comigo
Como se fora o pai provedor de minhas expectativas
Minha mulher insiste em meu ombro vazio
Não obstante esteja de quatro entre suas pernas
Alguns amigos saúdam-me
Com saudade e amor sinceros no afago da voz
Posso tocar estes afetos
No éter de minha história
Preciso crer, desesperadamente
Que o céu nublado
Na manhã depressiva
Não é o acúmulo de nuvens
De meus erros sucessivos
No tatame social
Golpes tantos que me levam à lona
Crimes todos que já os vou pagando por aqui mesmo
Não esperei a morte
Para purgar meus monstros
Mordeu-me em vida o cão da inércia
Quebrou-me a espinha a serpente do desejo

Não! Não sou o fracasso completo
Que ao espelho me vejo
E nem sou também
Essa fome absurda de sexo
A satisfazer-se com empregadas domésticas
E secretárias
E desocupadas
Aos banheiros públicos
E caixas automáticos de banco
Sou um homem! Por Deus, sou um homem!
Com ratos escondidos ao armário, sim
Com gatos no cio ao telhado da casa, sim
Sou um homem, porém
À luz do espírito
Mais que este horror ao espelho
Onde desabam todas as falhas
As doenças todas da família
Incompetências
Insanidades
Pavores
Não! Eu sou melhor do que ao espelho!
Eu sou melhor do que me vejo!
Sou também a soma de meus sonhos
A multiplicação de minhas esperanças
Sou por fim minha própria intenção de ser

Este sangue nas mãos
O filho roubado
Os amores partidos
Não! Não sou o fracasso completo
Que ao espelho me espeta
Repita comigo: eu me respeito!
Eu sou meu amigo!
Não! Não sou o fracasso completo
Que ao espelho me vejo
Repita comigo: eu me amo!
Eu me revejo!...
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