Demografia assombrosa

Em 1976, quando saí para estudar, ela contava 90 mil habitantes (aliás, em 1974, eu vi 50 mil de nós nas ruas do centro, no sepultamento de Dermeval Barbosa Moreira, médico humanitário amado indiscriminadamente por toda a população) e quando retomei o convívio das suas ruas, a partir de 2001, já estávamos a passos largos para os 183 mil de hoje, um crescimento brutal, desordenado, caótico;

Somada à quebra de sua identidade fabril, temperada que era pelo constante convívio com veranistas e visitantes, amantes todos de seu clima e da hospitalidade de seu povo, cujas dez etnias formadoras conformaram-lhe o caráter cosmopolita, essa explosão demográfica, decorrente de um êxodo das classes médias baixas da região e mesmo da região metropolitana, levou à bancarrota o espírito elitista e aristocrático do friburguense.

Perdemos o rebolado, em suma! A cidade da mais antiga banda sinfônica civil em atividade, das primeiras estradas de ferro e de uma das mais antigas lojas maçônicas do país, do idolatrado poeta parnasiano Julio Salusse, das férias de verão de Ruy Barbosa e Machado de Assis, a cidade que assistiu à estreia mundial de Heitor Villa-Lobos como compositor, que guarda obras arquitetônicas de Lucio Costa e jardins do consagrado arquiteto francês Glaziou, a minha velha Friburgo foi perdendo altitude no interior de seu vale apertado, cuja cobertura vegetal também declinou de modo significativo, e as ruas do centro, hoje, transbordam de gente, atulhadas de automóveis, sem qualquer solução de engenharia de tráfego à vista que lhe devolva a agradável fisionomia de antes ou, no mínimo, preserve-lhe a harmonia urbana para continuar a atrair e encantar visitantes pelo dom da tranqüilidade.

Foi transtornada em seus hábitos e ritmo; seus morros, ocupados de forma irregular; sua cultura suíço-alemã, pragmática e utilitária, decorrente dessas duas fortes presenças em sua colonização — lembre-se, Friburgo foi a primeira cidade do Brasil a acolher trabalhadores livres europeus como parte do início do processo de emancipação dos escravos africanos pela Coroa portuguesa, refugiou-se grandemente nas zonas rurais, onde guardam-se também os japoneses e o cultivo das flores de corte, segunda maior produção do Brasil.

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